CRÔNICAS DE VIAGEM - #EP02 - BRASÍLIA: A CIDADE INJUSTIÇADA

12-01-2022 20:06

Nós, brasileiros, temos a tendência de virarmos o pescoço quando ouvimos o nome Brasília. O nome já traz em si uma carga semântica pesada, sempre associado ao “mundo da política”. Afinal de contas, Brasília é a CAPITAL FEDERAL. O centro político da REPÚBLICA (Vai saber o que isso representa...). Em suma, carregamos, com raríssimas exceções, um certo “ranço” (Uma palavra muito usada atualmente e com inúmeros significados) desta cidade e resumimos tudo relacionado a ela à palavra POLÍTICA.

Brasília foi idealizada e construída para ser aquilo que ela é, a capital do país, o distrito da federação. Porém, ela não é somente isso. Confesso que, enquanto cidadão e professor de sociologia e política, Brasília sempre me despertou duas sensações: deslumbre, pelo marco modernizador (urbanístico e arquitetônico) que ela expressa para o país; e repulsa, por todo o processo desumanizante que acarretou o sonho modernista de JK. Essas duas sensações estavam comigo na bagagem, se juntando a uma terceira, descoberta durante a viagem: a ADMIRAÇÃO.

Admiração pelas paisagens do cerrado brasileiro. Admiração pela estrutura urbanística do “plano piloto”, idealizada por Lúcio Costa e todas as dificuldades que ela acarreta para os não-moradores e, também, para os moradores, conforme disse-me um senhor, ao perceber a minha dificuldade em me localizar na cidade: “Moço, estou há trinta anos aqui e não sei ainda como funciona esse lance de “asas” (norte e sul) e as “quadras”. Admiração pela população brasiliense viver a sua vida cotidiana, lutando pelo “pão de cada dia”, e, literalmente, “nem aí” para a tal da ESPLANADA DOS TRÊS PODERES (poderes executivo, legislativo e judiciário).

Também tiveram momentos nos quais a repulsa veio à tona. Brasília é uma cidade de migrantes. Migrantes que saíram de diversos cantos do Brasil, na década de 1950, e, se localizando no “Núcleo bandeirante” (O nome do bairro não foi à toa.), deram suas vidas desbravando o cerrado goiano, construindo e realizando o sonho de “integração nacional” do presidente Juscelino Kubitschek. São os chamados CANDANGOS, moradores das cidades-satélites (Cidades que giram em torno do “astro terreno”, plano piloto), tidos muitas vezes como invasores, pelos moradores do plano piloto e que não possuem, em suas cidades, transporte coletivo, arriscando suas vidas em vans clandestinas, ou fazendo o trajeto diário das cidades-satélites até o plano piloto de bicicleta. Além de repulsivo, isso é revoltante!

E é através desse conflito de sensações que Brasília me conquistou. Apesar dos problemas respiratórios causados pelo ar seco, admirei esta cidade tão injustiçada no imaginário social dos brasileiros, mas que possui pessoas simpáticas e solícitas, prontas para uma prosa casual. Um povo alegre e esperançoso, mesmo com as dificuldades diárias. Algo comum a qualquer brasileiro.

Termino citando um poema do poeta brasiliense Sérgio Avancine, no livro “Céu, Cerrado e Cidade: poemas para Brasília”, intitulado: “Inculta e bela”

“berço carioca

sotaque goiano

vernáculo mineiro [park wáy (?)]...

o português do df

[última flor do lúcio(?)]

é o esperanto brasileiro.”

 

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