TOLERÂNCIA E ALTERIDADE NO ROMANCE AS AVENTURAS DE PI

05-01-2016 19:29

Sabe-se que o único animal pensante na natureza é o Homem. Somos seres, capazes de estabelecer raciocínios teleológicos, antever e prever situações futuras, ou mesmo, lembrar-se de acontecimentos e de povos antepassados. Esse é um dos fatores, juntamente com o trabalho, que nos torna humanos, nos diferenciando de outras espécies. Por exercer essa fundamental função criam-se consequências sociais, muitas vezes, “conflituosas” para um convívio em sociedade, ao não tolerar o pensamento do outro.

Claro que tem certos pontos de vistas, análises, pensamentos e crenças que não devem ser aceitos por seu fundamento preconceituoso, racista, etc... Porém, naquilo que trata o presente texto, rios de sangue foram e são jorrados diariamente no mundo porque um grupo quer impor pela força (Poder!) o seu ponto de vista, a sua “verdade abstrata”, a sua concepção de vida e de sociedade sobre outros grupos, desmerecendo toda e qualquer teorização dos mesmos.

Isso não é, ou não deveria ser, novidade para ninguém, mas ao ler o romance de Yann Martel, chamado “As aventuras de Pi”, sucesso cinematográfico, pode-se perceber uma boa sacada sobre o assunto aqui tratado. O personagem central, ao ser resgatado do naufrágio que matou sua família, narra duas histórias para a equipe que o resgatou. Uma simples, básica e a outra recheada de animais e aventuras. Em qual acreditar? Pensaram os membros da equipe, metralhando-o com perguntas na tentativa, em vão, de achar “uma verdade”. Em resposta, Pi afirma: Nas duas histórias a minha família morre e eu sofro! Acredite naquela que fazer mais sentido para vocês. É o mesmo que acontece com deus! Em outras palavras – o que é o mesmo -, em ambas as histórias contadas por Pi há mortes e sofrimento, ou seja, existe um “elo concreto” que as une, diferenciando-as apenas pelo seu “elo abstrato”, as histórias criadas a partir dos “fatos reais e concretos”, o naufrágio e a morte da família do jovem indiano.

O livro merece ser lido e esmiuçado na sua totalidade, porém, necessita-se, aqui, explorar a sacada citada acima. Quando o autor do livro assevera, pela boca do personagem, que “é o mesmo que acontece com deus”, toma-se a liberdade de fazer a extensão e a relação para as outras formas de apreensão e explicação dos fenômenos naturais realizadas pelo Homem e, também, para aquilo que não é explicado pela lógica concreta, o que se chama Fé. Todas as apreensões mentais humanas, todas as formas de conhecimento (científico, religioso, popular/senso comum, etc...) se baseiam no entendimento dos seres humanos sobre o seu mundo exterior, com base nos mecanismos disponíveis em cada época histórica e, fundamentalmente, pela “cultura local”, que é, grosso modo, a maneira como os indivíduos de um determinado grupo social interpretam o mundo a sua volta e os fenômenos da natureza.

De outro modo, todas as elucubrações, teorizações e concepções de mundo e vida, diferentes entre si culturalmente, tem um fio condutor que as une e as entrelaça que é o ser humano. Nada disso ocorre, nem mesmo essa breve reflexão e o autor que a escreve, sem o “ato concreto da “produção e reprodução da vida material humana”, parafraseando as palavras do revolucionário judeu alemão do século XIX. São os Homens, seres biológicos e sociais os únicos capazes de construir as variadas formas de entendimento/conhecimento existentes e sistematizá-las para as futuras gerações, dando, assim, continuidade à humanidade. Por outro lado, também são os únicos seres capazes de colocar em risco o seu habitat natural e, consequentemente, a sua própria espécie e as outras como um todo.

 

Referência

Livro: As aventuras de PI

Autor: Yann Martel

Assunto: Literatura estrangeira

Idioma: Português

Ano: 2012

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